Bitcoin: Transações Ineficientes. Eficiente Reserva de Valor.

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“É uma forma extremamente ineficiente de realizar transações”

~Janet Yellen (Secretária do Tesouro dos EUA).

O Bitcoin foi criado com o propósito de ser um sistema de dinheiro eletrônico/digital de pessoa para pessoa ("a peer-to-peer electronic cash system"), sem um terceiro intermediário. Esse propósito veio evoluindo, já que novos desafios foram surgindo, e novos conceitos foram nascendo, trazendo novos caminhos e oportunidades para o mundo das criptomoedas. Atualmente, por alguns fatores imutáveis de seu protocolo como a oferta máxima de Bitcoins de até 21 milhões de unidades (com até 8 casas após a vírgula, para facilitar a divisibilidade) e como o efeito do halving que consiste no acontecimento programado de que a cada 4 anos é reduzida pela metade a recompensa em Bitcoin dos mineradores (tornando este ativo deflacionário até a última parcela minerada em ~2140, quando a taxa de inflação passará a ser zero), a narrativa predominante é que o Bitcoin poderia ser a melhor reserva de valor em existência.

Em 2017, nem todos os desenvolvedores da rede estavam de acordo com o caminho e proposta de valor que o Bitcoin entregava, e seguindo a liderança de Roger Ver (um dos primeiros investidores do Bitcoin), fizeram um hard fork* do Bitcoin, criando assim o Bitcoin Cash (BCH), com a explicação de que isso era seguir alinhado com a proposta inicial de Satoshi Nakamoto de ser um “peer-to-peer electronic cash system”. Para isso, com este hard fork, eles mudaram o bloco do Bitcoin de ~1MB para ~8MB, de modo que fosse possível realizar um maior número de transações a uma maior velocidade.

O problema desta mudança é que isto impactaria negativamente na descentralização do Bitcoin, um de seus maiores atributos, já que seria um impeditivo para que qualquer pessoa pudesse rodar um node** em casa para suportar a rede (atualmente, mais de 10,000 nodes, e é de longe a rede mais descentralizada em comparação com outras criptos), deixando a mineração, segurança e consenso da rede nas mãos principalmente de grandes mineradores, e menos na mão do cidadão comum que quisesse participar ativamente na mesma.

O Bitcoin Cash tem se mostrado um fracasso desde então, pois não conseguiu roubar a credibilidade do Bitcoin (pelo contrário, só deu mais força), resolveu parcialmente o problema da escalabilidade em detrimento de um dos maiores atributos do Bitcoin.

O problema da escalabilidade ainda persiste, porém já existem soluções melhores do que criar um ‘’novo Bitcoin’’. A mais conhecida e divulgada é a Lighting Network (LN), a qual cria uma rede de canais de pagamentos*** fora da blockchain do Bitcoin, usando contratos autônomos para assegurar que a rede funcione de forma descentralizada sem qualquer risco.

“Bitcoin é um banco no ciberespaço, administrado por software incorruptível, que oferece uma conta poupança global, acessível, simples e segura para bilhões de pessoas que não têm a opção ou o desejo de administrar seu próprio fundo de hedge.”

~Michael Saylor, CEO da MicroStrategy, no website hope.com

De todo modo, conforme mencionado na introdução deste artigo, a narrativa do Bitcoin em si hoje está mais para uma reserva de valor do que a de uma moeda capaz de realizar transações em larga escala e de forma instantânea. Para isso, existem uma infinidade de outros projetos sendo desenvolvidos, e cada um possui seu token nativo para ser usado em sua rede, e por aí vai.

A Ethereum, por exemplo, é a maior plataforma para o desenvolvimento de smart contracts (contratos inteligentes) e a rede que mais possui desenvolvedores atualmente (mais até do que o próprio Bitcoin). A esmagadora maioria dos projetos de finanças descentralizadas, ou DeFi (decentralized finance), estão sendo desenvolvidas sobre a plataforma da Ethereum. E além da Ethereum, existem diversas outras plataformas descentralizadas de smart contracts em andamento, como Cardano, Polkadot, Solana, Elrond, Tezos, Neo, etc.

Portanto, o Bitcoin não precisa ser tão eficiente e escalável como moeda (neste caso, como meio de troca) para ter valor, como foi comentado nesta semana pela Janet Yellen, Secretária do Tesouro dos Estados Unidos, que disse que o Bitcoin é extremamente ineficiente como moeda. E para completar, ela disse que o mesmo só serve para transações ilícitas e lavagem de dinheiro, sem trazer nenhum dado comprovando essas afirmações (na verdade, apenas 0.34% das transações da rede do Bitcoin foram mapeadas como sendo suspeitas/ilícitas pela empresa de Chainalysis — análise de transações em blockchains — contra 2% a 5% do produto interno bruto global, que seria algo em torno de $800B a $2T de dólares, de acordo com este relatório das Nações Unidas).

“Me dá um tempo. Ela (Janet Yellen) acha que imprimir trilhões de dólares falsos é eficiente? Ela não sabe que quanto mais dólares falsos ela imprime, mais eficiente e valioso o bitcoin se torna? Deus a abençoe.”

~Robert Kiyosaki, autor de "Pai Rico, Pai Pobre" (Obs: afirmação de ''dólares falsos'' possivelmente pela sua falta de lastro destes em ouro desde 1971).

O Bitcoin apenas precisa servir de reserva de valor (por ora) para ter seu valor crescendo exponencialmente e tomar/dividir o lugar com o ouro, que aliás, perde para o Bitcoin na grande maioria dos atributos que tornam esse metal relevante para este fim. Segue abaixo um comparativo de Bitcoin VS. Ouro VS. Moedas fiduciárias / emitidas por governos:

Fonte: elaboração própria, com base em diversas fontes online.

Existe ainda um argumento recorrente contra a possibilidade do Bitcoin poder ser ou não uma reserva de valor. Este argumento se chama: alta volatilidade. Pois bem. Segue abaixo uma imagem do gráfico de volatilidade do Bitcoin, mostrando que conforme sua capitalização vem crescendo, menos volátil este ativo vem se tornando.

Fonte: https://www.buybitcoinworldwide.com/volatility-index/

O próprio ouro é volátil ainda em certas circunstâncias extremas, porém é bem menos volátil do que o Bitcoin, obviamente, pois além de ser menos especulativo, o ouro possui uma capitalização de mercado de $10–12 trilhões de dólares VS. pouco menos de $1 trilhão de dólares do Bitcoin (na data em que este artigo está sendo escrito).

Sendo assim, é provável que seja questão de tempo para a volatilidade do Bitcoin cair mais e mais, enquanto a sua adoção aumentar ano após ano. Vale dizer que, com a decrescente emissão de novos Bitcoins (pelo efeito do halving) e crescente adoção, os últimos 10 dos 12 anos fecharam com uma valorização deste cripto ativo acima de 100%, sendo que o retorno anual médio (data inicial: 17/07/2010, a mais antiga disponível que consegui) até data de hoje foi de ~365% (em dólares USD). Volatilidade ruim essa, não?

Segue abaixo um gráfico mostrando a evolução do preço do Bitcoin em USD e os eventos de halving que tem gerado um choque de oferta na sequência:

Fonte: modelo Stock-to-flow por PlanB (Twitter: @100trillionUSD). Relaciona a escassez programada do BTC dos eventos halvings (queda da recompensa dos mineradores pela metade) a cada 4 anos com as bolhas especulativas que tem acontecido na sequência. Na imagem, o preço se inicia em $0,06 USD em Agosto de 2010 até último valor recente atualizado no gráfico de ~$57.000,00 USD em 21 de Fevereiro de 2021. Ganho total nesse período foi de ~95.000%. A variação de cores representam a quantidade de dias até o próximo halving.

Considerações Finais

Atualmente existem mais de 8.500 criptomoedas em circulação (sim, muita porcaria por aí). Nenhum projeto tem a legitimidade que o Bitcoin tem, nem o suporte de mais de 10,000 nodes trazendo descentralização e segurança para a rede, tornando esta a mais segura do que qualquer computador ou rede do mundo. Nenhum outro projeto precisará (e dificilmente conseguirá) tomar o lugar do Bitcoin como potencial reserva de valor. Outros projetos serão utilizados para situações diferentes, lugares diferentes, para comprar/vender coisas diferentes.

Temos um longo caminho pela frente, e desinformação, sejam fake news intencionais ou não, vão só confundir os desavisados, atrasar a adoção de quem não se questionar e confiar 100% no que é dito por aí por quem não entende (ou finge não entender) o tsunami disruptivo de todo o modelo financeiro existente atualmente, que vem se formando há mais de 12 anos, funcionando 24 horas por dia, 7 dias por semana, e com adoção crescente ano após ano, e sem nenhum ponto central como potencial falha.

O Bitcoin é, e precisa continuar sendo descentralizado, ter a participação do maior número de pessoas da rede para seu funcionamento, e estar disponível para todas as pessoas do planeta. Precisa ser feito de pessoas-para-pessoas. "A peer-to-peer electronic cash system".

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Grupo do Telegram: https://t.me/BitcoinizedBR

English Article: https://bitcoinwizard.medium.com/bitcoin-inefficient-way-of-conducting-transactions-vs-store-of-value-de19c215e6c9

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Referências:

*Full Node: Também conhecido como “nó completo”, o Full Node é um software instalado no seu computador que valida as transações e blocos na rede Blockchain do Bitcoin. Pode parecer a mesma coisa, mas a validação é bem diferente da mineração. Fonte.

**Hard Fork: atualização de linhas de códigos de forma intensa e complexa mudando atributos imutáveis do protocolo, criando uma nova rede bifurcada, que não mais é a rede anterior.

***Canais de pagamentos (Lightning Network): um canal de pagamentos para duas partes é criado quando ambas as partes criam uma transação multiassinaturas no blockchain, em que pelo menos uma parte envia fundos ao registro). Fonte.

Relatório das Nações Unidas sobre lavagem de dinheiro: https://www.unodc.org/unodc/en/money-laundering/overview.html

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